Em uma tarde de domingo, às 16 horas e 50 minutos, mais precisamente no dia 16 de julho de 1950, os uruguaios conquistaram o mundo. O Maracanã estava completamente lotado, incluindo convidados, profissionais que estavam a serviço e todos os torcedores, havia quase 200 mil pessoas no estádio. O Brasil tinha tudo para ser o campeão e para isso era preciso apenas um empate naquele jogo dentro do quadrangular final. Entretanto, apesar de ainda sair à frente do placar, o Uruguai conseguiu a vitória por 2 x 1, com o gol de Ghiggia. E então surgiu o famoso ‘Maracanazo’.
A Copa do Mundo de 1950 era o primeiro torneio em doze anos. Isso porque a Segunda Guerra Mundial (entre 1939 e 1945) praticamente paralisou as competições intercontinentais. Os Jogos Olímpicos foram realizados em 1936, na cidade de Berlim, e somente seriam disputados em 1948, em Londres. Até então, a última Copa do Mundo de futebol havia sido realizado na França em 1938 e voltaria a ser realizada no Brasil em 1950.
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A TRAJETÓRIA ATÉ O JOGO FINAL NA COPA DE 1950
Antes de se encontrarem na última partida do quadrangular final, Brasil e Uruguai haviam se enfrentado três vezes antes do início da Copa. Dessa forma, a seleção canarinho conquistou duas vitórias, uma por 3 x 2 e outra por 1 x 0. Por outro lado, os uruguaios venceram um encontro por 4 x 3. Embora a superioridade da equipe brasileira fosse reconhecida na época, não era uma diferença muito grande.
No quadrangular final, os uruguaios conseguiram um sofrido empate contra a Espanha em 2 x 2, e uma vitória de virada, já nos instantes finais, contra a Suécia por 3 x 2, somando então três pontos (a vitória valia dois pontos na época). Por outro lado, o Brasil havia aplicado duas goleadas, a primeira um 7 x 1 nos suecos, e depois 6 x 1 nos espanhóis. Sendo assim, a equipe obteve a melhor campanha na reta final, consequentemente, jogaria pelo empate na decisão contra os uruguaios.
Por tudo isso, os brasileiros estavam convictos de que seriam os campeões. Jornais na época divulgaram posters da Seleção Brasileira de que conquistariam ali o primeiro título de Copa do Mundo, antes da partida final. O jornal vespertino “A Noite“, do Rio, foi às bancas na véspera com a seguinte manchete, acima da foto do time do Brasil posado: “Estes são os campeões do mundo”.
Mas o time uruguaio era forte, tendo o time base em jogadores do Nacional e Peñarol. No gol, tinha o versátil Maspoli; na defesa, os valentes Tejera, Gambetta e o incansável capitão Obdulio Varela; no ataque, os habilidosos Ghiggia, Julio Perez e Schiaffino.
O ‘MARACANAZO'
Muitos fãs do futebol consideram que a camisa pesa em muitos momentos, certo? Pois é, e naquela ocasião o Uruguai era muito mais vencedor que o Brasil no futebol. A Seleção Celeste havia conquistado duas medalhas olímpicas em 1924 e 1928, que eles consideram como títulos de Copa do Mundo, OITO taças de Copa América, além da primeira edição de Copa do Mundo, essa em 1930, na França. Por outro lado, o Brasil havia conquistado ‘apenas’ três Copas Américas, inclusive, a última naquela ocasião, um ano antes da Copa. O momento era dos brasileiros, mas então a camisa pesou…
Depois de um 1º tempo sem gols, o ponta Friaça abriu o placar, para a euforia dos torcedores anfitriões. Afinal, restavam menos de 45 minutos, e o empate daria o título ao Brasil. Mas aos 22 minutos Schiaffino igualou o placar. E 13 minutos depois, Ghiggia fez o gol da vitória uruguaia, o gol que emudeceu o Maracanã, e um país inteiro naquele 16 de julho de 1950.
Assim, o Uruguai, subestimado por todos, se tornava o bicampeão da Copa do Mundo. Nem o consolo da artilharia de Ademir Menezes, com nove gols, amenizou o trauma da perda do título, que se abateu sobre a torcida brasileira. Na tentativa de encontrar um culpado para a derrota do Brasil o lateral Bigode e principalmente o goleiro Barbosa foram acusados de ter falhado no segundo gol uruguaio e tiveram que conviver com esse fantasma até o fim da carreira. E convenhamos, o goleiro de fato falhou no gol.
Além disso, os brasileiros ainda culparam o uniforme, alegando que este deu azar para a seleção. Sendo assim, a partir daí, o Brasil abandonou o branco e passou a jogar com o seu clássico uniforme amarelo. Por fim, a partida ficou conhecida para os uruguaios como ‘Maracanazo’, uma das maiores decepções brasileiro de todos os tempos.
https://www.youtube.com/watch?v=6pMmRFKKZfk
A COMEMORAÇÃO DOS URUGUAIOS
Diz a lenda que os os uruguaios, campeões do mundo, na noite daquele domingo saíram nas ruas do Rio de Janeiro e consolaram os brasileiros completamente decepcionados. E cá entre nós, não faz nenhum sentido, difícil até imaginar um brasileiro ao lado de Ghiggia, depois do atacante calar o Macaranã. Fato é que houve uma grande festa no hotel, onde os jogadores celestes estavam hospedados.
– Depois do jogo, houve uma grande festa no hotel e eles (diretores do Uruguai) deram a ordem para que ninguém saísse. Eles jamais iriam tirar minha liberdade naquele momento! Então eu disse: ‘agora estou no comando‘ – afirmou o capitão Obdulio Varela, ao diário uruguaio ‘Hechos', em maio de 1968.
Varela não era uma pessoa que gostava de entrevistas ou fama. Entretanto, numa das poucas vezes que narrou em detalhes na noite da final foi em uma entrevista que o jornalista uruguaio Franklin Morales conduziu em sua casa 18 anos depois. O meia apelidado de “Negro Jefe” disse que os líderes uruguaios do futebol foram comemorar “em um cabaré” e beberam vinho no hotel com Ernesto “Matucho” Figoli, massagista do time. O álcool era um velho conhecido da juventude de Varela, que cresceu em uma casa pobre e vendeu jornais nas ruas quando criança.
No entanto, não há nenhum registro do capitão uruguaio que levantou a taça Jules Rimet no local onde mencionou…
– Fizemos uma coleção de nossa parte (‘vaquinha' como se fala no Brasil) para comprarmos alguns sanduíches e cervejas. E fomos a um quarto para comemorar. Essa foi a celebração que fizemos. Exceto Obdulio (Varella)… Acho que ele foi a um bar na esquina – são falas de de Alcides Ghiggia, responsável pelo ‘Maracanazo', no programa Canal + Fever Maldini da Espanha, em fevereiro de 2014.
AFINAL, PARA ONDE O CAPITÃO CELESTE FOI?
Ao longo dessas décadas, várias histórias surgiram na imprensa brasileira e uruguaia – até na literatura e no cinema – sobre a noite do capitão uruguaio no Rio. Mas em nenhum desses há uma indicação clara de onde exatamente Obdulio estava. Alguns disseram que ele foi ao bairro de Copacabana, a alguns quilômetros ao sul do hotel. Porém, não há nada concreto.
Manuel Epelbaum, jornalista argentino, afirmou saber para onde o capitão foi porque ele o viu de frente ao hotel Paysandú. Logo, passou a seguir Varela, que segundo ele, estava sozinho. E em um momento Obdulio percebeu que estava sendo seguindo e teria dito que queria solidão, estar em paz consigo mesmo, sem festa ou qualquer coisa do tipo… Então o jogador uruguaio sentou-se em um bar, bebeu em silêncio e depois de alguns minutos continuou andando pelas ruas sem rumo.
Na entrevista de Obdulio em 1968, o próprio admitiu que teria chegado ao hotel às sete horas da manhã, achando que iria encontrar todos os seus companheiros dormindo. Mas na verdade todos estavam acordados ”com emoção”. Inclusive, Roque Máspoli, seu companheiro de Peñarol ainda estava sem acreditar na conquista e lhe perguntou “é verdade que vencemos ontem, Obdulio?“.
A verdadeira história talvez nunca tenha sido revelada… Fato é que Obdulio Varela, Ghiggia, Schiaffino e todos os outros uruguaios que estavam presentes no Maracanã, ou Maracanazo, em 1950, fizeram história pela Seleção Uruguaia. Até então, o segundo e último título dos uruguaios, que chegaram mais próximo de mais uma conquista em 2010, com Forlán, Suárez e companhia, ficando em 4º lugar.
O capitão Varela veio a falecer em 2 de agosto de 1996 – suas cinzas estão enterrados no Cemitério do Cerro, em Montevidéu. Por outro lado, o autor do gol, talvez o mais importante do Uruguai, Alcides Ghiggia foi o último jogador daquela partida história a nos deixar, quando se foi em 16 de julho de 2015.