A Fifa está recebendo pressão para excluir a seleção iraniana do Grupo B da Copa do Mundo do Catar 2022, por conta dos últimos acontecimentos e conflitos que estão abalando as estruturas daquele país e chocando comunidade mundial. Uma petição foi feita por um grupo de atletas do Irã, assinada pelo advogado espanhol Juan Dios Crespo, do escritório de advocacia Ruiz-Huerta & Crespo, especialista em direito desportivo.
O pedido se baseia no sistema de opressão às mulheres na sociedade iraniana, por conta de uma interpretação que a teocracia que governa o país faz do Alcorão, o livro sagrado dos muçulmanos. Segundo um dos trechos da carta divulgada à mídia internacional endereçada à Fifa, fala sobre o estado de guerra civil que está dominando aquela nação, por causa da revolta das mulheres, que não aceitam mais serem tratadas como cidadãs de segunda categoria.
A carta também alerta a exclusão de pessoas do sexo feminino de atividades ligadas ao futebol, a partir do momento em que a presença delas é proibida em estádios pela Federação Iraniana, acusada de infringir direitos humanos. Em janeiro, houve apenas uma exceção à regra vigente, que só liberou que homens e mulheres assistissem juntos o jogo contra a seleção do Iraque, válido pela eliminatórias para o Catar, após 40 anos de segregação.
Juridicamente não será possível retirar o Irã da Copa do Catar, mas a entidade maior do futebol mundial já dá acenos de que vai repensar o tratamento dado aos países que desrespeitam os direitos humanos e outros preceitos democráticos na hora de escolher uma sede para as suas competições principais.
Denúncias e conflitos nas ruas
No meio desse grupo de atletas que enviaram a petição à Fifa, está o ex-jogador Ali Daei, que é considerado um ídolo do futebol iraniano de todos os tempos e teve o seu passaporte confiscado ao voltar da Turquia, após apoiar o movimento. Além dele, Ali Karimi, Hossein Mahini e Aref Gholami se queixaram de ameaças recebidas por parte do governo local.
O Irã vive uma convulsão social depois que uma jovem curda chamada Mahsa Amini, que tinha 22 anos e morreu após ser presa pela polícia de costumes, por ser acusada de não cobrir a cabeça de maneira correta, violando os códigos de vestimenta feminina do país, que exige o uso de roupas discretas.
Leia aqui a íntegra da carta das personalidades iranianas enviada para o presidente da Fifa Gianni Infantino.
“A brutalidade e a beligerância do Irã em relação a seu próprio povo chegou a um ponto de inflexão, exigindo uma desassociação inequívoca e firme do mundo do futebol e do esporte. A abstinência histórica da FIFA em relação aos conflitos políticos tem sido muitas vezes tolerada apenas quando essas situações não se encontram na esfera do futebol. A situação das mulheres no Irã é profundamente desagradável no quadro político e socioeconômico mais amplo. Tragicamente, os mesmos males e injustiças são perpetuados dentro da esfera do futebol, significando efetivamente que o futebol, que deveria ser um lugar seguro para todos, não é um espaço seguro para as mulheres ou mesmo para os homens. As mulheres têm sido constantemente negadas a ter acesso a estádios em todo o país e sistematicamente excluídas do ecossistema do futebol no Irã, o que contrasta fortemente com os valores e estatutos da FIFA.
Se as mulheres não podem entrar nos estádios em todo o país, a Federação Iraniana de Futebol está simplesmente seguindo e impondo diretrizes governamentais; elas não podem ser vistas como uma organização INDEPENDENTE e livre de qualquer forma ou tipo de influência. Isto é uma violação do (Artigo 19) dos estatutos da FIFA. Esta disposição foi, no passado, a premissa para a suspensão de associações de futebol como a FA do Kuwait, a FA da Índia e até mesmo a Federação Iraniana no passado. A situação no Irã não é diferente do governo de um país que exige que a Associação de Futebol imponha uma proibição de estádios a pessoas de uma determinada raça ou etnia. Não é diferente de um governo que exige que uma associação membro mude a regra de impedimento em todas as ligas do país. Nesses outros casos, a FIFA provavelmente se moveria rapidamente para suspender tais associações membros, especialmente na segunda situação hipotética relativa às “Leis do jogo”. A Federação Iraniana de Futebol claramente carece de autonomia para aplicar os Estatutos da FIFA pela carta, seus Regulamentos e, o mais importante, seus valores caros.
Se, entretanto, a FIFA pensa que a Associação Iraniana de Futebol não está sob a influência de seu governo, e está agindo unicamente como uma organização independente, então proibir todas as mulheres de entrar nos estádios e participar da Copa do Mundo viola os Artigos 3 e 4 dos Estatutos da FIFA (a FIFA respeitará e protegerá os direitos humanos reconhecidos internacionalmente). Pelo artigo 16 dos mesmos Estatutos, o Conselho da FIFA está estatutariamente habilitado a tomar medidas drásticas e imediatas contra eles. O Conselho da FIFA pode e deve suspender imediatamente o Irã.
A FIFA deve escolher um lado. A neutralidade da FIFA não é uma opção, dado que a FA iraniana não tem sido neutra, mas tem sido mobilizada para fortalecer a opressão e a exclusão sistemática das mulheres no ecossistema esportivo. Além das mulheres, o governo iraniano também abafou as vozes de vários atletas no país e impediu seus direitos de falar diante do mal em exibição. Jogadores da equipe nacional como Hossein Mahini, Aref Gholami e ex-jogadores proeminentes como Ali Karimi e Ali Daei, foram alvo de prisão, assédio ou ameaças do governo. Chegou a hora de a FIFA agir; basta.”
Foto Destaque: Divulgação/Fifa