No dia 21 de abril de 2006, aos 74 anos de idade, Telê Santana nos deixava. Seu falecimento comoveu todos os brasileiros que, em algum momento, acompanharam sua vasta carreira. Posteriormente, após sua partida, nascia um legado. Dessa maneira, a coluna relembra a trajetória gloriosa do mestre Telê, considerado até os dias atuais um dos principais nomes do futebol brasileiro.
Índice
O LEGADO
Antes de se consagrar como um dos mais importantes jogadores e treinadores da história, Telê Santana carregou por muito tempo a alcunha de “pé frio“. Sobretudo, lidava com tal fama porque havia perdido duas edições de Copas do Mundo. Porém, o malfeito não o impediu de ser eleito pela Revista Placar como um dos melhores treinadores da década de 90. Posteriormente, 13 anos após seu falecimento, no ano de 2019, esteve na 35ª posição como o único brasileiro a integrar o ranking dos 50 maiores treinadores de futebol de todos os tempos, publicada pela revista francesa France Football.
Decerto, se na Seleção Telê deixava à desejar, nos clubes que comandava, fazia seu papel com maestria. Entre os anos de 1990 e 1996, comandou o São Paulo, onde conquistou muitos títulos e se tornou ídolo da torcida. Até os dias atuais, é considerado como o maior treinador tricolor de todos os tempos. Seu legado é denominado como “A era do mestre Telê“. Do mesmo modo, também é querido por torcedores do Fluminense. Assim, na equipe, foi destaque tanto em sua passagem como jogador quanto como treinador. Ainda no clube carioca, também tem uma marca registrada: está eternizado com o termo “fio de esperança”.
Reprodução/Trivela
O INÍCIO
Nascido no distrito de Itabirito, em Belo Horizonte, no dia 26 de julho de 1931, Telê Santana era o terceiro de 10 filhos de Seu Zico e Dona Corina. Desde a infância, encantava-se por futebol, e seu clube do coração era o Fluminense, do grande craque Norival. O jovem rapaz era um torcedor apaixonado e acompanhava a equipe com o maior alvoroço nas transmissões de rádio.
Iniciou a carreira no interior de Minas Gerais, no modesto clube Itabirense. Durante as partidas, quando a equipe era derrotada, notava-se certa maturidade no garoto, que admitia os erros e emponderava uma postura de seus colegas. Com isso, antes de partir rumo ao Rio de Janeiro, defendeu também o América de São João Del Rey.
FLUMINENSE
Com 19 anos, Telê Santana chegou ao Rio de Janeiro para tentar uma chance em seu clube de coração, o Fluminense. Posteriormente, ao passar por testes contra o Bonsucesso e anotar cinco gols, foi aprovado com o aval do então dirigente João Coelho Netto, o famoso Preguinho. De início, integrou-se ao juvenil das Laranjeiras, onde venceu o Estadual da categoria nos anos de 1949 e 1950. Em 51, foi convertido ao profissional pelas mãos do técnico Zezé Moreira. Logo no primeiro Carioca, mostrou a que veio. Deslocado como centroavante por conta da suspensão de Carlyle, marcou dois gols na decisão contra o Bangu, o suficiente para logo se tornar ídolo e despontar.
Seu maior feito aconteceria no ano de 1952, quando, ao lado de outros grandes nomes, como Didi e Castilho, venceria a Taça-Rio. A competição reuniu grandes equipes como o uruguaio Peñarol, o português Sporting e o Corinthians. Com a conquista, consolidou-se e chegou a ser apelidado pelo cronista Mário Filho como “o fio de esperança”. Em suma, era um reconhecimento por toda sua entrega dentro de campo. Ao todo, foram 557 partidas e 165 gols com a camisa do Tricolor. Por isso, é o quinto maior artilheiro da história do clube. Em títulos, soma dois Campeonatos Carioca, de 1951 e 1959, dois Torneios Rio-São Paulo, de 1957 e 1960, e uma Copa Rio, de 1952.
Reprodução/Tardes de Pacamebu
UM SONHO QUE NUNCA SE REALIZOU
Apesar de toda qualidade em campo, o talento de Telê Santana nunca foi o suficiente para levá-lo a ser um jogador de Seleção Brasileira. Simultaneamente, a concorrência era pesada e contava com nomes de calibre como de Garrincha, Julinho Botelho e Joel. Ainda assim, o ponta do Flu chegou a ser convocado para um amistoso contra Portugal, mas uma lesão o impediu de entrar em campo. Desse modo, nunca mais ganharia uma outra chance como jogador.
EXPERIMENTANDO NOVOS MEIOS NO FUTEBOL
Após pendurar as chuteiras, Telê ainda tinha a intenção de permanecer no mundo do futebol. Por conta disso, decidiu se arriscar na carreira de treinador. Logo, comandou a categoria de base justamente do Fluminense, clube , portanto, em que havia se consagrado quando jogador. Na equipe, não demorou para conquistar seu primeiro título: um Campeonato Carioca Juvenil, em 1968.
Com o sucesso, no ano seguinte, foi promovido a comandante do time profissional, onde também veio a ser campeão carioca na mesma temporada. Similarmente, tal elenco formou a base do time campeão do Torneio Roberto Gomes Pedrosa de 1970, quando já havia deixado a equipe. Inclusive, o mesmo time do Flu, que havia comandado dois anos antes, disputou a final contra o Atlético-MG, na época seu atual clube. Meses mais tarde, aliás, seria campeão do Campeonato Mineiro e, no ano seguinte, conquistaria a taça do Brasileirão.
Ainda no Galo, com seu ímpeto de justiça, lutou pelos direitos de seus jogadores. Os atletas eram obrigados a entrar e sair do clube pela porta dos fundos, e a atitude era represada por Telê. O comandante entendia que tal ato era uma desvalorização com o profissional. Por isso, após reunião com dirigentes, pediu para que abrissem a porta dos fundos, pois desejava sair por ela, em forma de protesto. Ao ter seu pedido negado, já que não era jogador, poderia sair pela entrada social. Em ato de rebeldia, recusou-se e pulou o muro.
“Eu disse que também fui jogador e que o aviso servia para mim também”, disse Telê em declaração anos mais tarde.
OUTRAS EQUIPES
Chegou ao São Paulo em 1973 e permaneceu na equipe até julho daquele ano. A curta passagem se deu ao entrar em conflito com um dos ídolos do Paraná, Toninho Guerreiro. Sobretudo, o sucesso pela equipe viria anos mais tarde. Nesse meio tempo, retornou ao Atlético-MG em agosto, permanecendo no clube até setembro de 1975, sendo substituído pelo, até então, inexperiente Mussula.
No primeiro semestre de 76, assumiu o comando técnico do Botafogo. Contudo, sem obter os resultados esperados, logo se transferiu para o Grêmio, substituindo Paulo Lumumba. Nos gaúchos, permaneceu até meados de 78, levando a equipe a recuperar a hegemonia perdida do Campeonato Gaúcho, após oito anos de domínio do rival, Internacional. Posteriormente, em 79, foi contratado pelo Palmeiras, onde permaneceu até fevereiro do ano seguinte, quando foi convidado a comandar a Seleção Brasileira.
UMA SEGUNDA CHANCE NA SELEÇÃO
Se como jogador Telê Santana não havia conseguido se firmar na Seleção Brasileira, como treinador, a história foi outra. Em fevereiro de 1980, foi anunciado oficialmente como comandante do Brasil pelo então presidente da CBF, Giulite Coutinho. À frente do elenco da Copa do Mundo de 1982, implantou uma forma de jogo que encantava, não somente os torcedores brasileiros, como também o restante do mundo.
Nossa agremiação apresentava um futebol bonito e envolvente, aclamado como o melhor da época. Simultaneamente, integrou jogadores técnicos como Zico, Sócrates e Falcão. Apesar do empenho, muitos cobravam a presença de um ponta direita em campo, e a eliminação nas quartas de final para a Itália culminou em uma avalanche de críticas. Ao todo, foram 38 partidas à frente da Amarelinha.
“Eu me aborrecia um pouco com isso. O time buscava ocupar o espaço ali na direita. Se eu tivesse um grande ponta, como o Garrincha, é lógico que ele iria jogar. Comigo sempre jogam os melhores”, garantiu Telê Santana.
TERCEIRA CHANCE
Após sua primeira passagem pela Seleção, foi contratado, em 1983, pelo Al-Ahli, da Arábia Saudita. A transação de alto custo integrava sua comissão técnica: Marinho Peres e Moraci Sant’anna. Em novembro de 84, Telê confirmou o interesse da CBF em seu retorno, porém o clube árabe não o liberou. Assim, após acordo com o Al-Ahli, enfim, retornou aos comandos da Seleção em 85, dessa vez, para substituir Evaristo de Macedo. Contudo, a intenção da CBF era que apenas integrasse os jogos das Eliminatórias para a Copa do Mundo de 1986. Porém, novamente ao corresponder as expectativas, foi anunciado pelo recém vice-presidente, Nabi Abi Chedid, como o treinador para o Mundial daquele ano, desbancando o favoritismo de Rubens Minelli.
Na competição sediada no México, em sua convocação, buscou valorizar a experiência e montou uma equipe com jogadores remanescentes de 1982. Criticado anteriormente por não exigir muita disciplina dos atletas, dessa vez, estava mais atento. Desse modo, tal ação fez com que não tolerasse atitudes irresponsáveis. Assim, após chegar atrasado na concentração, o gremista Renato Gaúcho acabou cortado.
Em protesto por achar a punição injusta, o melhor amigo do jogador, o lateral Leandro, pediu dispensa da equipe. Assim, apesar de apresentar um bom futebol, a Seleção acabou novamente eliminada da Copa. O modo que o desfecho se culminou, de forma invicta, após uma disputa de pênaltis contra a França, fez com que Telê fosse tachado como “pé frio” por parte da imprensa brasileira.
Reprodução/Museu da Pelada
PAUSA E UM RECOMEÇO
Após toda pressão, Telê resolveu dar um tempo na profissão. Retomou a carreira somente em agosto de 1987, novamente atuando pelo Atlético-MG. No Galo, permaneceu até o ano seguinte, quando foi convertido ao Flamengo. Pelo Rubro-negra, estreou com goleada de 5 x 1 diante o Guarani. Não se sabe ao certo o motivo aparente, se existia alguma mágoa por situações passadas por parte de Renato Gaúcho, mas, após uma discussão com o jogador, Telê acabou por rescindir com o Fla.
Posteriormente, pela segunda vez, passou a treinar o Fluminense, em outubro, onde ficou até o fim do ano. Posteriormente, em 90, comandou o Palmeiras, também pela segunda vez. Simultaneamente, aventurou-se pela carreira de comentarista esportivo na Copa do Mundo, transmitida pelo SBT. Permaneceu no Verdão até setembro, quando entregou o cargo após derrota no Parque Antártica diante o Bahia. Posteriormente, no mês seguinte, assumiu o comando do São Paulo, a princípio, até o fim daquele ano.
A ERA TELÊ
Em síntese, no São Paulo, viveu os melhores anos da sua carreira como treinador, conquistando muitos títulos. Chegou para renovar uma equipe que estava desgastada, apresentado desempenhos pífios, como o do Campeonato Paulista daquele ano. Logo de cara, apostou no talento de Raí, que viria a ser um dos principais jogadores da temporada. Assim, além do craque, também depositou sua confiança nos novatos Antônio Carlos, Cafu, Leonardo e Elivelton.
Levou o time, que ocupava uma posição intermediária no Brasileirão, até a final, obtendo o vice-campeonato diante do Corinthians. Em 1991, com o time entrosado, a essa altura tendo Raí como o líder em campo, o elenco ganho evolução. Nesse ínterim, conquistaram o Nacional. Meses depois, reencontrou os rivais alvinegros na final do Paulistão e deu o troco ao se sagrar campeão. Com o êxito, passou a ser o único técnico brasileiro a ter conquistado os quatro principais Campeonatos Estaduais do país: Paulista, Carioca, Mineiro e Gaúcho.
Seguindo, foi campeão continental pela primeira vez na Copa Libertadores da América, em 1992. O estilo de armação técnica, num esquema 4-2-2-2, com alta posse de bola, faria Telê conquistar o mundo ao vencer o Barcelona. Ao mesmo tempo que disputava a competição internacional, também competia na final do Paulistão diante o Palmeiras. Entretanto, também se sagraria campeão. Sendo assim, tais atos o consagrariam como o melhor técnico sul-americano de 1992.
CAMPEÃO DE TUDO
Contudo, seu ano de glória ainda estava por vir, e seria em 1993. Após golear por 5 x 3 os chilenos do Universidad Católica, foi campeão da Libertadores. A segunda conquista foi a Recopa Sul-Americana, vencida na disputa de pênaltis contra o Cruzeiro, após empatarem os dois jogos. Além disso, faltando menos de um mês para o Mundial, ainda foi campeão da Supercopa Libertadores, conquistada na disputa de pênaltis contra o Flamengo. Em dezembro, conquistou novamente o título mundial diante o Milan.
Assim, após quatro títulos internacionais somente em um ano, alçou a marca inédita da quádrupla coroa internacional. Em gratidão, passou a ser chamado de “Mestre” pela torcida são-paulina. Por fim, mesmo após 14 anos de sua partida, o eterno Telê Santana é relembrado com carinho, não somente pelos Tricolores como também por todos os brasileiros.

Foto destaque: Reprodução/Arquivo CBF